terça-feira, 11 de novembro de 2008

O Fim do Sonhar

Publicado originalmente em NoNaMe's HiDEOuT

Aviso: Escrito pelo Garoto Spoiler

Não há nada mais interessante do que a capacidade de gerar reações químicas no nosso corpo que uma história bem contada tem. Eu ainda estou tremendo um pouco, culpo a fome, mas sei que não é apenas isso. Sinto um vazio que mistura a plenitude de nada precisar, a satisfação do fim de uma jornada e o vazio de ter perdido um grande amor. Terminei agora a última edição de Sandman, onde o Lorde Morpheus se despede de uma vez por toda de nós, e juro que o que mais me surpreende neste momento é a ciência de que, apesar d'eu nunca ter ido muito com a cara do Senhor dos Sonhos, fui grandemente cativado por ele e que sinto um grande pesar por sua partida. Sinto como se um grande amigo tivesse partido, como se tivesse acordado do mais belo e significativo sonho de minha vida. Realmente me agarrei àquelas últimas páginas como quando percebemos que vamos acordar e apertamos os olhos, buscando ficar mais um pouquinho. E acordo tentando não me mover, saboreando os resquícios oníricos, feliz ainda por ter vivido aquilo tudo, mas angustiado ao mesmo tempo por não ter mais a certeza de voltar àquele lugar.

Mas...

"Por que isso aconteceu? Por que ele deixou acontecer?"
"Deixar, Matthew? Creio que ele fez um pouco mais do que deixar acontecer...
Generosamente... creio... às vezes, talvez, é preciso mudar ou morrer.
E, no fim, talvez houvesse limites para o quanto ele podia se permitir mudar."
- Conversa entre o corvo Matthew e o Bibliotecário Lucien em Sandman, Depertar.

Ao terminar Entes Queridos, o melhor arco de histórias de Sandman, acreditei que a morte do Senhor dos Sonhos era fruto de uma sucessão de erros. Foi um erro Morpheus visitar Hyppolyta para avisar que seu filho seria dele; foi um erro ele ter libertado Loki, deixando uma imagem em seu lugar; foi um erro aceitar o convite de Delírio na busca de seu irmão, Destruição; foi um erro ele ter atendido ao pedido de seu filho Orpheus e matá-lo; foi um erro ter concedido o direito a um pedido à Nuala - e tê-lo atendido num momento muito impropício; foi um erro não ter forçado Thessaly (agora Larissa) a matar Lyta Hall e mais um monte de erros em série que levaram aquela manifestação do Sonhos dos Perpétuos ao final de sua existência.

Eu estava errado. Qualquer uma dessas coisas podia ser remediada, reparada. Sandman poderia ter fugido, como sugeriu Nuala. Poderia ter feito as coisas acontecerem de outro jeito. Mas isso implicaria mudanças em seu jeito de ser; implicaria ferir o seu orgulho; implicaria assumir um fraqueza que não poderia ser assumida; implicaria se tornar um ser baixo, rasteiro; implicaria não mais ser um ideal. Entre abrir mão de sua essência, tornando-se algo que não convinha com sua altivez e enfrentar a aniquilação total, o Senhor do Sonhos escolhe a segunda. Sábado passado, duas pessoas que me são realmente caras me comparam ao Lorde Morpheus devido ao meu orgulho. Confesso que fiquei enaltecido por ter sido comparado a tamanha personalidade, mas neguei as comparações. Eu não me julgo uma pessoa orgulhosa, mas o contrário. Considero-me uma pessoa que reconhece os danos do orgulho excessivo e evita-os ao máximo. Porém, quando aqueles que o conhecem lhe dizem verdades, é melhor ouvir. E, em um ponto eu concordo em haver semelhanças entre eu e Morpheus: a forma dramática com que encaramos toda nossa existencia e nossos relacionamentos. Há um momento em Um Jogo de Você, se não me engano, em que Sonho acaba de receber a notícia de que não é mais amado pela donzela que estava com ele desde então e cria uma tempestade assustadora que assola todo o sonhar, externando assim tudo aquilo que sentia em seu peito. Muitos sabem que se eu tivesse poderes semelhantes, teria feito o mesmo após o termino do meu namoro no começo do ano. E julgo que seria bem capaz que ela teria o mesmo destino de Nada, como é contado em Estação das Brumas. Talvez, então, penso eu, que eu seja um pouco orgulhoso sim. Muito mais do que eu imaginava e que talvez eu e o Senhor dos Sonhos tenhamos muito mais em comum do que eu aceito.

Talvez seja exatamente por isso que eu nunca tenha ido muito com a sua cara. Talvez seja por isso que eu sofra tanto com a sua partida. Porra, e eu que sempre pensei que Sandman fosse coisa de viado.